quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Cristiano Ronaldo, o filho do mérito


Podemos analisar Cristiano pela aparência ou fazê-lo a partir do essencial. Relativamente à aparência temos o penteado, a exibição de músculo, alguma declaração sem protocolo, o Ferrari, a namorada e todas as exibições que nos levam a classifica-lo como alguém de sucesso quimicamente puro segundo os parâmetros destes tempos. No essencial, dorme como um menino, come como um bailarino, treina como um marine e pensa como um campeão... Os que escolhem a aparência encontrarão motivos para o odiar, os que optam pelo essencial só poderão admirá-lo.

Aqui chegamos a um ponto crítico da análise: não nasceu craque; tornou-se craque. É fruto do sacrifício, caso contrário, não teria abandonado a família aos 13 anos nem o país aos 17 para perseguir um sonho. É fruto do seu esforço e como prova basta olhar para o corpo que aquele mirrado adolescente fabricou. É fruto da ambição, focada na excelência, na contínua procura de melhorar, para conseguir o grande final. Não de atinge esse nível sem partir de uma vantagem natural, mas o Cristiano é a demonstração que o talento é só um bom ponto de partida. O extraordinário percurso das suas condições desde o berço até à versão desatada que temos visto este ano, chama-se mérito.

No entanto, a sua evolução não se deve apenas ao corpo mas também à técnica. Cristiano ama a bola e dedica horas ao difícil labor de se entender com ela. Mexe-lhe à vontade com qualquer parte do corpo exibindo o seu domínio com graciosidade, atrevimento e eficácia em posses e passes; eliminando adversários porque lhes ganha na corrida e porque os engana com habilidade; converte em indecifráveis os seus ‘tiros’ com bolas paradas ou corridas; cabeceando, como foi dito, encontrando-se com a bola no ponto mais alto e rematando com a testa para coloca-la entre os três paus. Como todos os grandes da história do futebol, é capaz de pôr de acordo a precisão com a máxima velocidade.

Enquanto os seus opositores continuam a olhar para insignificâncias, Cristiano aproveita também para progredir nos seus comportamentos. Houve um tempo em que dava a impressão que o jogo só lhe pertencia a ele. Os passes eram feitos sem vontade, como se resolver as questões futebolísticas de forma colectiva fosse uma humilhação. Contudo, também foi capaz de trabalhar essa debilidade que o convertia numa espécie de genial corpo estranho dentro de uma equipa. Hoje é uma parte do todo. Para sermos justos: é o melhor de todos.

[A partir de um longo artigo de opinião do argentino Jorge Valdano, ex-director desportivo do Real Madrid, publicado numa revista colombiana]

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