segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

Há-de vir um Natal e será o primeiro


  LADAINHA DOS PÓSTUMOS MORTAIS

   Há-de vir um Natal e será o primeiro
   em que se veja à mesa o meu lugar vazio


   Há-de vir um Natal e será o primeiro
   em que hão-de me lembrar de modo menos nítido


   Há-de vir um Natal e será o primeiro
   em que só uma voz me evoque a sós consigo


   Há-de vir um Natal e será o primeiro
   em que não viva já ninguém meu conhecido


   Há-de vir um Natal e será o primeiro
   em que nem vivo esteja um verso deste livro


   Há-de vir um Natal e será o primeiro
   em que terei de novo o Nada a sós comigo


   Há-de vir um Natal e será o primeiro
   em que nem o Natal terá qualquer sentido


   Há-de vir um Natal e será o primeiro
   em que o Nada retome a cor do Infinito 


    David Mourão-Ferreira in Obra Poética

1 comentário:

  1. Anónimo30/12/14

    Um homem só morre verdadeiramente quando morrer o último homem que dele se lembre e o invoque.

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